Por Amadeu Roberto Garrido de Paula.
A União deve
pedir (ou pediu) ao STF [Supremo Tribunal Federal] que module os efeitos de seu julgamento que
concluiu pela incidência do PIS e da COFINS sobre o ICMS. Logicamente
incensurável. Até as pedras podem saber que tributo não pode ser base de
cálculo de tributo. Entretanto, nesta República de Bizâncio, uma
interminável e perdida no tempo discussão sobre o tema foi travada.
Ocorre
que, enquanto a discussão agita o cérebro, para o contribuinte mexe no
bolso. Assim, diante de um tributo de constitucionalidade duvidosa, a
depender de um pronunciamento do STF a perdido de vista, o que fazer?
Por mais que os contribuintes ou seus advogados tenham absoluta
convicção da inconstitucionalidade, quem pode pronunciar o vício e a
consequente invalidade da respectiva lei é a Justiça, materializada em
nossa Suprema Corte Constitucional. As decisões dos juízes inferiores
sempre estarão sujeitos a invariáveis recursos do Fisco. Como se sabe,
uma década é pouco para tanto.
Nesse
interregno, o que fazer? A conduta mais prudente é ir a Juízo, mas não
somente com o pedido declaratório. Fazê-lo acompanhado de uma medida
cautelar e depósito mensal da diferença devida. Se o resultado não for
favorável, o Fisco levanta o valor deposito e "tollitur quaestio". Ao
contrário, firmar-se na posição e recolher apenas o que se entende
devido, por mais inteligente e culto que seja o entendimento do
contribuinte, poderá ser uma ação temerária.
É
que a lei regulatória das ações de inconstitucionalidade (lei nº 9.868,
de 1999), em seu art. 27, dispõe que o STF pode "modular" os efeitos temporais de seus julgamentos de inconstitucionalidade. O critério
também é adotado pela Corte nos processos subjetivos. Menos pudicos e
mais literais que os Ministros brasileiros, os do Tribunal
Constitucional Português falam diretamente em "manipulação" desses
efeitos.
Significa isso que uma lei
jamais é inconstitucional, por si só, desde seu nascimento. Passa a ser
inconstitucional, a partir do momento do pronunciamento definitivo da
Suprema Corte, a depender da vontade de seus Ministros. É fácil perceber
o poder - inaceitável - que esse sistema dá a essas Supremas Cortes
Constitucionais. O processo só é posto em pauta de acordo com as
decisões da Presidência do Tribunal. Consequentemente, uma lei poderá
ser declarada inconstitucional depois de três anos; outra depois de
cinco e outra depois de dez. Enquanto isso, poderá produzir seus
nefastos efeitos. Sim, nefastos, porquanto assim se presumem todas as
expressões normativas contundentes da Constituição.
Fica
ao arbítrio do Plenário da Corte dizer se a lei deve ser considerada
inconstitucional desde o princípio, ou se apenas de seu julgamento
(efeitos "ex tunc" ou "ex nunc"). Logo, se "ex nunc", a
inconstitucionalidade da incidência do PIS e COFINS sobre o ICMS só
valerá a partir do julgamento do STF, como quer a União. Em relação ao
período anterior, valerá a lei e o contribuinte será considerado
devedor.
Muitos lembram-se do
episódio da CSSLL, devida pelos prestadores de serviço. Havia uma Súmula
do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que a disciplinava em favor do
contribuinte. Claro que a grande maioria dava crédito ao entendimento do
STJ. O STF firmou posição contrária, mandou às calendas a Súmula e,
pior, não modulou os efeitos, declarando, pois, a inconstitucionalidade
desde o início. Todos os contribuintes que seguiram o STJ ficaram
devedores - por importâncias acumuladas - do Fisco, salvo se tivessem
efetuados aqueles depósitos cautelares. Um flagrante e deplorável
exemplo de falta de sincronia e unidade mínima entre os órgãos
superiores da justiça e de insegurança jurídica.
Visto
que a tendência é fiscalista, sobretudo num momento de crise financeira
do Estado, da qual os contribuintes não foram responsáveis, e o
arbítrio, puro e simples, é a energia ministerial do efeito "modulador",
nesta hipótese é admissível supor que o entendimento favorável ao
contribuinte seja considerado como seu marco inicial determinante, sem
retroagir (efeito "ex nunc").
A
consequência será que os contribuintes que não pagaram o PIS e a COFINS
sobre o ICMS, durante longo, longo tempo transcorrido, deverão fazê-lo,
em princípio de um jato. Só estarão livres em relação às parcelas que
incidiriam a partir do acórdão do STF. É manifestação de uma balbúrdia
que comprime os contribuintes brasileiros e, não raro, levam empresas a
quebrar. Esperemos que o STF rejeite o pedido da União, por equidade e
justiça. É a nossa realidade.
Fonte: Segs.
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